Artigos 11 e 13: Gigantes da tecnologia enfim acordam para risco do plano da União Europeia que ameaça a internet

Por Rhett Jones, em 5 de dezembro de 2018

Com a decisão do Tumblr, nesta semana, de proibir pornografia em sua plataforma, todo mundo está vendo em primeira mão o quão ruins os filtros de conteúdo automatizados são no momento. Legisladores da União Europeia querem um sistema parecido para filtrar trabalhos protegidos por direitos autorais, e, apesar do consenso dos especialistas de que isso só vai ferrar com a internet, a legislação avança. Agora, algumas das maiores plataformas da rede estão insistindo que devemos impedir essa regulamentação.

YouTube, Reddit e Twitch recentemente saíram publicamente contra a nova diretiva de direitos autorais da União Europeia, argumentando que a legislação iminente poderia ser devastadora para suas empresas, seus usuários e a internet em geral.

A Diretiva de Direitos Autorais é a primeira atualização da lei de direitos autorais da UE desde 2001 — e é uma grande reformulação que visa recuperar parte do dinheiro que os detentores de direitos autorais acreditam ter perdido desde que o uso da internet explodiu ao redor do globo. Fundamentalmente, suas disposições devem punir grandes plataformas como o Google por lucrar com a violação de direitos autorais e repassar parte da renda de volta para as mãos daqueles a quem ela pertence por direito.

Infelizmente, a forma como ela é projetada provavelmente dificultará a vida de plataformas menores, prejudicará a troca livre de informações, matará memes, tornará o uso justo mais difícil de se navegar — enquanto isso, os gigantes da tecnologia terão os recursos para sobreviver ao desastre. Você não precisa acreditar na minha palavra, ouça Tim-Berners Lee, o pai da world wide web, e os outros 70 grandes tecnólogos que assinaram uma carta contestando a legislação em junho.

Até agora, essa questão não recebeu o tipo de atenção que, digamos, a neutralidade da rede recebeu, pelo menos, em parte, porque é muito complicado explicá-la, e leva algum tempo até que caia a ficha para esse tipo de coisa. Anteriormente, descrevemos os detalhes em várias ocasiões. A principal coisa a entender é que os críticos discordam de duas partes da legislação.

O Artigo 11, também conhecido como “imposto sobre links“, exigiria que as plataformas online comprassem uma licença para linkar outros sites ou citações de artigos. Essa é a parte que ameaça a livre disseminação de informações.

O Artigo 13 dita que as plataformas online instalem algum tipo de sistema de monitoramento que permita que os detentores de direitos autorais subam seu trabalho para detecção automática. Se algo escapar dos filtros do sistema, a plataforma poderá enfrentar penalidades completas por violação de direitos autorais. Por exemplo, um meme do Bob Esponja pode ser sinalizado e bloqueado por causa de sua imagem de origem pertencente à Nickelodeon; ou um vlog bobo pode ser sinalizado e bloqueado porque há uma esponja no fundo, e o filtro burro pensa que é o Bob Esponja.

Um problema importante na diretiva de direitos autorais é que ela é incrivelmente vaga e não explica como esse sistema deve ser implementado. Os filtros de conteúdo supostamente se assemelham ao sistema Content ID, do YouTube, em que a empresa gastou dezenas de milhões de dólares para desenvolver e que ainda faz um trabalho terrível.

Algoritmos são muito limitados naquilo que conseguem fazer bem, no momento. Como a UE não está definindo exatamente como o sistema de filtragem funcionaria, seus defensores podem alegar que não estão dizendo que você teria que usar um sistema semelhante ao Content ID, do YouTube. Talvez isso aconteça por meio de mágica? Até mesmo a CEO do YouTube, Susan Wojcicki, disse, em uma carta a criadores de conteúdo do YouTube em outubro, que esse sistema será impraticável.

Wojcicki, especificamente, apontou que o Artigo 13 ameaça a subsistência das pessoas que publicam conteúdo. Ela escreveu:

A proposta poderia forçar as plataformas, como o YouTube, a permitir apenas conteúdos de um pequeno número de grandes empresas. Seria arriscado demais para as plataformas hospedarem conteúdos de criadores de conteúdos originais menores, porque as plataformas passariam a ser diretamente responsáveis por esses conteúdos. Percebemos a importância de todos os detentores de direitos serem justamente compensados, e é por isso que construímos o Content ID e uma plataforma para pagar todos os tipos de proprietários de conteúdo. Mas as consequências não intencionais do Artigo 13 colocarão esse ecossistema em risco. Estamos comprometidos em trabalhar com a indústria para encontrar uma maneira melhor.

Evidentemente, apoiadores da diretiva de direitos autorais dirão que ela é projetada para restringir a capacidade de plataformas como o YouTube de lucrar com violações de direitos autorais. Mas isso não explicaria por que uma coalizão de associações de detentores de direitos autorais, incluindo o braço internacional da MPAA, se manifestou contra a diretiva em uma carta em 1º de dezembro.

Na semana passada, o Reddit entrou significativamente na discussão e também condenou a legislação. A rede social reconheceu que é uma empresa americana com um público principalmente nos EUA, mas essa é uma questão que afeta a rede global e suas fronteiras praticamente inexistentes. Em um post de blog, o Reddit escreveu:

Estes requisitos eliminam os “portos seguros” anteriores que nos permitiam a margem de manobra para dar aos usuários o benefício da dúvida quando compartilhavam conteúdo. Mas, com a nova Diretiva, atividades que são fundamentais para o Reddit, como o compartilhamento de links para artigos de notícias ou o uso de conteúdo existente para novos propósitos criativos (r/photoshopbattles, pessoal?), passariam a ser questionáveis sob a lei, e não está claro neste momento que existam medidas atenuantes viáveis que poderíamos tomar, preservando a funcionalidade essencial do site. Pior ainda, tentativas menores mas parecidas em vários países da Europa no passado mostraram que tais esforços de fato prejudicaram editoras e criadores.

A última empresa a se manifestar contra a Diretiva de Direitos Autorais da UE parece ser o Twitch. A empresa de streaming ao vivo tem supostamente circulado uma carta aos seus criadores de conteúdo obre a legislação, mas, quando pedimos confirmação à companhia, não tivemos resposta. A suposta carta explica o caminho que a diretiva seguiu até agora e emite um aviso de que toda a empresa pode estar em risco. Lê-se em parte:

Vocês e suas comunidades trabalharam muito para construir este lugar incrível, e vale a pena protegê-lo. As consequências do Artigo 13 não se limitam aos criadores de conteúdo da União Europeia. Todos perderão se o conteúdo que sai e entra na região for sufocado.

[…]

Como o Artigo 13 torna o Twitch responsável por qualquer potencial atividade de infração de direitos autorais com obras publicadas, o Twitch pode ser forçado a impor filtros e medidas de monitoramento em todas os trabalhos publicados por residentes da União Europeia. Isso significa que você precisaria fornecer informações de propriedade de direitos autorais, autorizações, ou tomar outras medidas para provar que você cumpre as espinhosas e complicadas leis de direitos autorais. Criadores de conteúdo, muito provavelmente, teriam de lidar com os falsos positivos associados a essas medidas, o que também limitaria o conteúdo que podemos disponibilizar aos espectadores na UE.

[…]

Operar sob essas restrições significa que seria muito mais difícil publicar uma variedade de conteúdos, incluindo comentários, críticas, obras de fãs e paródias. Comunidades e telespectadores de todos os lugares também sofreriam, com menos opções de entretenimento, crítica e muito mais.

Mesmo que essas plataformas estejam fazendo essas declarações por interesse próprio, isso não significa que elas estejam erradas. Julia Reda, membro do Parlamento Europeu pelo Partido Pirata que se opôs à diretiva desde o início, explicou recentemente por que ela não acha que as soluções do YouTube sejam úteis, afirmando que tudo isso está errado mesmo. Em um post de blog na segunda-feira (3), Reda aplaudiu os grupos de interesses especiais que estão acordando para os problemas inerentes ao projeto. “Em vez de resolver um problema específico e bem identificado com uma solução bem avaliada, os legisladores tentaram usar a lei de direitos autorais para reequilibrar o poder entre várias grandes indústrias, sem considerar os danos colaterais que estavam causando”, escreveu. “Vamos abandonar completamente o Artigo 13 e enviar a diretiva de volta para a mesa de projetos”.

Para complicar ainda mais a capacidade de aumentar a sensibilização em torno do assunto e reunir oposição à diretiva, há um processo parlamentar complexoenvolvido em sua promulgação. Em setembro, o Parlamento Europeu a aprovou por maioria esmagadora. Agora, representantes da Comissão, do Conselho e do Parlamento Europeu estão envolvidos nas negociações do trílogo para chegar a um acordo sobre várias alterações. Outra votação completa está prevista para o início de 2019. Em seguida, espera-se uma votação final até ao fim do atual mandato do Parlamento, em abril.

Disponível em: <https://gizmodo.uol.com.br/gigantes-tecnologia-risco-uniao-europeia-artigos-11-13/>. Acesso em: 8 dez. 2018.

Webinar “Bibliotecas e direitos autorais: perspectivas perante a Organização Mundial da Propriedade Intelectual e mudanças na União Européia”

A Comissão Brasileira de Direitos Autorais e Acesso Aberto da FEBAB tem a honra de convidá-l@s para o Webinar:

Bibliotecas e direitos autorais: perspectivas perante a Organização Mundial da Propriedade Intelectual e mudanças na União Européia

Data e horário: 10 de Outubro de 2018 – 10 horas (GMT -3 – Horário de Brasília)

Transmissão via YouTube: youtu.be/dNYK-Xt1wbg  [Atenção: a apresentação será em Espanhol]

Síntese: O mundo digital oferece novas e melhores maneiras para as bibliotecas fornecerem acesso ao conhecimento. Embora a tecnologia esteja disponível, certas mudanças não podem ocorrer devido a barreiras legislativas. É por isso que a IFLA está presente em debates internacionais, regionais e nacionais nos quais leis são necessárias para as bibliotecas no mundo digital. Em fóruns como a Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI), a IFLA exige a adoção de exceções e limitações aos direitos de autor, que, sem representar um risco para os detentores de direitos, permitem bibliotecas levar a cabo a sua função. Nos últimos meses, a OMPI adotou um plano de ação sobre esse assunto, e a União Européia está incorporando mudanças para adaptar sua lei de direitos autorais ao mundo digital. Ariadna apresentará como funciona a OMPI, o plano de ação sobre exceções e limitações de direitos autorais para bibliotecas, arquivos e museus, e como colaborar de fora. Também explicará brevemente quais são as mudanças que estão sendo adotadas na União Européia e o impacto que elas podem ter nas bibliotecas.

Palestrante:
Ariadna Matas
Ms. Ariadna Matas – Diretora de Política e Pesquisa da Federação Internacional de Bibliotecários e Associações de Bibliotecas (IFLA) desde março de 2017, onde trabalha em questões de direitos autorais para garantir mudanças legislativas adequadas para as bibliotecas. Seu principal fórum de ação é a Organização Mundial da Propriedade (OMPI) e outros fóruns regionais e nacionais. Ariadna é advogada e estudou direito em Barcelona, Espanha, e fez mestrado em propriedade intelectual em Estrasburgo, França.


Debatedor@s:

Sueli Mara Soares Pinto Ferreira

Sueli Mara Soares Pinto Ferreira – Professora Titular da Universidade de São Paulo (USP), Brasil. Coordenadora da Comissão Brasileira de Direitos Autorais e Acesso Aberto da Federação Brasileira de Associações de Bibliotecários, Cientistas da Informação e Associados (FEBAB, desde 2016).  Membro do Conselho Técnico Científico do IBICT (2008-2010, 2017-2019). Membro Grupo de Especialistas Internacional do IAP Group (International Advocacy Programme) da International Federation of Library Association (IFLA, 2015-2016). Secretária da Divisão V Regional da IFLA (2015-2017). Presidente do Comitê Permanente da Seção para América Latina e Caribe da IFLA (IFLA LAC (2015-2017), sendo membro desde 2011-2019. Membro do Conselho de Governo da IFLA (2017-2019). Presidente da Divisão V Regional da IFLA (2017-2019). Membro do Comitê Profissional da IFLA (2017-2019). Membro do Conselho Consultivo do Programa de Desenvolvimento de Bibliotecas da IFLA (2017-2019).

 

Walter Couto

Walter Couto – Doutorando em Ciência da Informação pela Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP). Mestre em Estudos de Cultura Contemporânea pela Universidade Federal de Mato Grosso (2016). Graduado em Comunicação Social (Rádio e TV) pela Universidade Federal de Mato Grosso (2013). Atuou como roteirista de videoaulas e como tutor virtual para cursos de comunicação digital da Faculdade Aberta do Brasil – UAB/UFMT (2012) e como docente em cursos livres de Mídias Digitais na UFMT (2011). Atua principalmente nas áreas de Comunicação e Informação, com ênfase na Interface Comunicação-Ciência, Teorias Contemporâneas e Cibercultura/Mídias Digitais. Atualmente, pesquisa controvérsias na pirataria/compartilhamento de artigos científicos, especialmente o Acesso Aberto Negro (Black Open Access) realizado por meio de Bibliotecas Ocultas (Shadow Libraries) ou por sites de redes sociais.


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Disponível em: <http://www.febab.org.br/cbda3/webinar-20181010/>. Acesso em: 2 out. 2018.

União Europeia dá sinal verde para nova lei de direitos autorais que pode arruinar a web

O Parlamento Europeu aprovou, nesta quarta-feira (12), a Diretiva de Direitos Autorais da União Europeia, um conjunto de reformas que pode mudar drasticamente a maneira como usamos a internet. Inicialmente, a diretiva havia sido rejeitada, mas, agora, especialmente com versões alteradas dos polêmicos artigos 11 e 13, a votação final foi de 438 votos a favor e 226 contra.

• Saiba mais sobre o desastroso projeto de lei de direitos autorais que ameaça a liberdade na rede

As diretrizes do documento são, em sua maioria, tímidas, mas são esses dois pontos, os artigos 11 e 13, que têm causado mais discussão. Chamados de “imposto sobre links” e “filtro de upload”, respectivamente, eles basicamente teriam o potencial de acabar com muito da liberdade de publicação na rede por parte dos usuários.

O artigo 11 forçaria grandes plataformas, como Google e Facebook, a pagar pelo privilégio de linkar uma organização jornalística. Essas restrições, no entanto, proibiriam até um site de usar uma citação ou o título de um artigo ou mesmo colocar um link levando a ele, a menos que esse site pague por uma licença de link.

Já o artigo 13 é ainda mais preocupante. Ele implantaria um sistema de requisitos de proteção de direitos autorais que forçaria os sites a impedir o upload ilegal de qualquer material protegido por direitos autorais. Isso mesmo, antes mesmo dos arquivos serem publicados em qualquer plataforma que seja. Na prática, isso tornaria ilegal a publicação de um vídeo engraçado na balada, por exemplo, já que a inclusão da música de fundo estaria violando os direitos autorais. Imagens protegidas em um meme? Ilegal. Selfie com camisa de determinada banda? Ilegal. E você já poderia dar adeus a remixes, mashups e fanfics também.

Basicamente, o texto exigiria a implementação de um sistema parecido com o que o YouTube tem de identificação de conteúdo protegido por direitos autorais, só que pior, já que as empresas precisariam bolar uma maneira de se antecipar à publicação e impedir o upload dos arquivos protegidos.

Executivos e eurodeputados contrários à diretiva afirmam que ela é muito confusa e que isso abrirá brechas para interpretações ainda mais preocupantes do que os pontos citados acima, com o diretor executivo da associação de direitos digitais EDRi, Joe McNamee, afirmando ao Verge que “o sistema é tão complicado que na última sexta-feira o comitê de assuntos legais do Parlamento Europeu tuitou uma avaliação incorreta do que está acontecendo”. “Se eles não entendem as regras, o que esperam do restante de nós?”, questionou McNamee.

Ao Gizmodo, a eurodeputada alemã Julia Reda, do Partido Pirata, afirmou que todas as preocupações de acadêmicos, especialistas e usuários que levaram à rejeição do texto em julho ainda permanecem. “A decisão de hoje é um golpe duro na internet livre e gratuita. Apoiando novos limites técnicos e legais sobre o que postamos e compartilhamos online, o Parlamento Europeu está colocando lucros corporativos acima da liberdade de expressão e abandonando princípios longevos que tornaram a internet o que ela é hoje”, disse Reda.

A decisão agora passará por mais uma votação em janeiro de 2019, mas a probabilidade de ela ser rejeitada mais uma vez é baixa, segundo especialistas. Depois disso, cada estado membro da União Europeia deverá implementar a diretiva individualmente. O que, com a confusão do texto descrita acima pelos críticos ao documento, pode gerar situações bastante ameaçadoras para a liberdade dos usuários na rede.

[VergeGizmodo]

Por: 

12 de setembro de 2018 às 12:00

Disponível em: <https://m.gizmodo.uol.com.br/uniao-europeia-sinal-verde-lei-direitos-autorais/>. Acesso em: 13 set. 2018.